20 Feb

A Liberdade de Contratar e os Shopping Centers

 

O shopping center, entendido como o recinto em que floresce particular forma de comércio varejista, surgiu nos Estados Unidos, nos anos 50. Alguns empresários de visão concluíram que seria uma boa idéia reunir em um só local uma variada gama de produtos e serviços, para assim proporcionar ao consumidor o one-stop shopping, isto é, a satisfação de virtualmente todas as demandas de consumo de uma pessoa em um único espaço.

Após cinqüenta anos de próspera parceria, empreendedores e lojistas norte-americanos continuam a basear suas relações no mesmo regime vigente desde o nascimento dessa revolucionária modalidade de varejo, isto é: segundo condições contratuais livremente estabelecidas pelas partes, descartada qualquer espécie de intervenção do legislador no negócio.

A premissa adotada naquele país é muito simples: os empresários que participam de um shopping center – tanto empreendedores como lojistas – conhecem melhor do que ninguém o seu negócio e sabem que lidam com um empreendimento dinâmico, de conquista diária do consumidor, no qual a intervenção legislativa nenhuma contribuição tem a oferecer.

A liberdade de contratar como fonte de sucesso para o shopping center não é característica desse empreendimento apenas nos Estados Unidos. Também no Brasil vigora, desde 1991, o regime da liberdade contratual, sendo que, nesses últimos vinte e cinco anos, a indústria brasileira de shoppings desfrutou de um crescimento fabuloso.

Com efeito, nos dias de hoje, o segmento opera com números altamente positivos: são mais de duas centenas de empreendimentos em pleno funcionamento (quase metade no interior), com um rol de dezenas de milhares de lojistas especializadíssimos no negócio, que gera um faturamento anual de dezenas de bilhões de reais (e outra fortuna em arrecadação de tributos), além de quase um milhão de empregos diretos (e algum múltiplo disso, se considerados os indiretos), tudo culminando com uma visitação aos empreendimentos na ordem de duzentos milhões de consumidores por mês.

Em território europeu, a liberdade de contratar também desponta como pilar da viabilidade do empreendimento. Ilustra essa realidade recente decisão do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal, que assim comenta o contrato entre lojistas e empreendedores:

“Um lojista de centro comercial integra-se num complexo plurifacetado e harmônico de estabelecimentos e tem, por isso mesmo, de orientar o seu procedimento não só pelo que interessa às relações entre ele e o dono do local, mas, também, pelo que diz respeito ao universo dos lojistas, na sua específica mais valia. Estão em jogo, no sofisticado complexo representado pelo centro comercial, os interesses do grande capital e do grande consumo, a justificar soluções jurídicas diferentes das aplicáveis ao comércio de rua. Neste campo de interesses, justifica-se que as normas jurídicas reguladoras correspondam, em agilidade e leveza, às pertinentes necessidades de rapidez negocial, informalidade e predomínio da autonomia individual (...).” (decisão disponível na internet, em http://www.stj.pt, processo 98A834, Relator Quirino Soares).

De fato, a autonomia da vontade representa, justamente, o veículo necessário à conformação do empreendimento. Graças à liberdade contratual, viabiliza-se a adoção de sistemas de incentivo à adesão de lojas âncora aos shoppings, por meio de método de rateio de despesas racional e detalhado nos instrumentos contratuais, o que aumenta a produtividade de todos os lojistas. É a liberdade contratual reinante que atrai investimentos de massa no setor como ocorre, nos Estados Unidos, com os fundos imobiliários e, no Brasil, com os Fundos de Pensão.

Em suma, de forma simples e direta, a liberdade de contratar constitui, no Brasil e no mundo, o fundamento essencial do regime jurídico do shopping center.

(Revista ABRASCE - 02/2006)
por José-Ricardo Pereira Lira